Projeto 50/50: Abrindo portas para equidade de gênero na Comunicação.

Conheça quem desenvolveu e qual foi o motivo principal para a criação do Projeto 50/50, responsável pela militância da necessidade de equidade de gênero dentro das áreas profissionais de comunicação

Quando falamos em criação publicitária, percebemos uma grande discrepância entre os números de cargos ocupados por homens em relação às mulheres. Isso não deixa de ser mais um reflexo da sociedade patriarcal em que vivemos.

Projeto 50/50 / Instagram

O projeto 50/50 nasceu em 2017, a partir de uma iniciativa de alunas e professoras da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), no Rio Grande do Sul. O gatilho aconteceu enquanto elas estavam presentes no Festival Mundial de Publicidade de Gramado, desse mesmo ano, em que havia somente 4 mulheres em um total de 29 palestrantes – um número questionador e desafiador. Entretanto, esse número também é um reflexo da predominância masculina na criação publicitária, em que temos 74% dos cargos ocupados por eles.

Além disso, 90% das mulheres publicitárias já relataram algum tipo de assédio ou abuso, sejam eles morais ou sexuais dentro do ambiente de trabalho. Isso infelizmente também reflete a nossa cultura perante à normalização e imobilização dos casos de estupro e assédio tanto em ambientes de trabalho, quanto em qualquer participação nas esferas sociais. Pode-se perceber a partir dessas denúncias, que, lamentavelmente, a mulher não possui liberdade social há muitos anos, ocasionando assim, desconforto e desinteresse em participações que envolvem uma alta porcentagem de integrantes masculinos nas equipes.  

Curso de capacitação / Instagram do projeto

Dado isso, o Projeto 50/50 visa segundo as próprias palavras: “Problematizar a configuração de gênero na propaganda, tanto no meio acadêmico, quanto no mercado de trabalho, oferecendo visibilidade para o assunto e, principalmente, promovendo ações no ambiente acadêmico, visando que estas se reflitam no mercado publicitário e, consequentemente, na sociedade”. Eles também estabelecem metas como: criar debates e discussões perante a desigualdade de gênero; fazer rodas de conversa com as acadêmicas para que possam se posicionar da melhor forma no mercado; proporcionar cursos de capacitação em criação publicitária; levar a conscientização e o ideal do projeto para outras universidades.

Juliana Petermann / Instagram pessoal

Já em seu primeiro ano, o projeto conquistou a contemplação no edital da FAEN/2017, O que acarretou na premiação para a professora idealizadora, Juliana Petermann, na categoria “Destaque em Ensino” na UFSM.

Desde então, o projeto tem feito parte da trajetória de inúmeras mulheres em formação (universitária ou escolar) – e também já formadas. O projeto promove constantemente oficinas, palestras, eventos e rodas de orientação. Tudo para que aumentem, ainda mais, a sua competência, experiência e número de contatos – o popular networking na linguagem publicitária.

Roda de conversa / Instagram do projeto

Com a pandemia, assim como em todas as áreas, o Projeto 50/50 teve que se adaptar às atividades remotas e suspender suas visitações, ou ainda, qualquer tipo de exercício que promovesse a aglomeração. Ao conferirmos o Instagram, cujo deixaremos anexado aqui para que você visite, podemos notar que os eventos e reuniões continuaram tendo adesão e participações de mulheres de sucesso do ramo publicitário.

Atualmente, o projeto tem sido pauta de pesquisas em nível de mestrado e até interações entre as demais universidades do Rio Grande do Sul. Além de contar com o apoio de agências de publicidade, agências de pesquisa e, agora também, com os programas de Pós-Graduação em Comunicação da UFSM e da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), o que acarretou em artigos e materiais didáticos publicados.

Roda de conversa / Instagram do projeto

Essa integração do projeto em outras universidades se dá graças às professoras: Juliana Petermann da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM), Fernanda Sagrilo da Universidade Federal do Pampa (UNIPAMPA) e da Elisa Piedras e Laura Wottrich da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).

E porque ele se chama 50/50?

Eventos / Instagram do projeto

O projeto idealiza que nos próximos anos, os cargos de criação dentro da comunicação social cheguem no percentual de 50% homens e 50% mulheres. Fazendo com que se igualem os gêneros dentro do ambiente de trabalho nessa área da comunicação. E é por esse motivo que essas professoras trazem toda uma conscientização envolvida em eventos, palestras e cursos de capacitação, para que as novas gerações de mulheres comunicadoras passem a observar que elas possuem voz e vez dentro da sua área de trabalho.

Criação: Gabriela Hessel Jasiocha

Revisão de texto: Luana Talita Gomes

A balbúrdia dentro das pesquisas científicas no Brasil

Entenda um pouco mais sobre a trajetória de Jaqueline Goes de Jesus, a pesquisadora brasileira que sequenciou o genoma da Covid-19 em 48 horas

Jaqueline Goes de Jesus para Forbes

Jaqueline Goes de Jesus, é baiana, e concluiu sua graduação em Biomedicina pela Universidade Federal da Bahia (UFBA). Fez seu mestrado em Biotecnologia em Saúde e Medicina Investigativa através do Instituto de Pesquisas Gonçalo Muniz – Fundação Oswaldo Cruz (IGM-FIOCRUZ) e veio a conquistar o seu doutorado em Patologia Humana e Experimental pela UFBA, em conjunto com o IGM-FIOCRUZ. Ainda em seu doutorado, ela teve a oportunidade de frequentar a Universidade de Birmingham, na Inglaterra, usando o modelo popularmente conhecido como sanduíche. No ano de 2019, ela concluiu o seu pós-doutorado em Doenças Infecciosas pela Universidade de São Paulo (USP).

Quando verificamos o currículo Lattes de Jaqueline, podemos notar uma vasta listagem de participações científicas ativas, sendo algo muito maior do que acabou de ser mencionado. Deixaremos o link aqui para que você possa conferir os processos e ver a quão árdua é a trajetória de um cientista brasileiro, ainda mais quando se trata de uma mulher negra.           

E o que ela fez de tanta importância no Brasil?

Equipe CDDE para Tiago Queiroz/Estadão

Jaqueline é pesquisadora bolsista na Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), e também faz parte do Centro Conjunto Brasil-Reino Unido para Descoberta, Diagnóstico, Genômica e Epidemiologia de Arbovírus – o CADDE. Ela e os demais integrantes do grupo, que é composto em quase totalidade por mulheres, sequenciaram o genoma do SARS-CoV-2, o tão temido Covid-19, em 48 horas. Sendo que a média mundial para a obtenção do sequenciamento é de 15 dias. Tornando assim, um feito histórico e brasileiro.

Na época, quem chefiava o grupo era a Jaqueline. E as eventuais descobertas se deram no Instituto Adolf Lutz, estabelecimento parceiro da CADDE, que também é chefiado por uma mulher: a Doutora Ester. Ela, por sua vez, é formada em medicina pela USP e resolveu dedicar sua vida às pesquisas científicas.

Jaqueline/Instagram pessoal

Segundo Ester e Jaqueline, obter esses resultados são, completamente, atividades normais para o grupo. Afinal, eles faziam o mesmo trabalho com os vírus da Zica, Dengue, Chikungunya e demais mazelas que vêm a criar epidemias no Brasil. A Jaqueline ainda ressalta que essas apurações só foram possíveis por conta da tecnologia e cooperação empregada pelos colaboradores do Reino Unido. Tais aparelhos vieram a reduzir os custos e acelerar os resultados, pois o que antes custavam entre $1.000 a 500 dólares, hoje custam entre $20 a 40 dólares por amostra.

Quando o grupo estabeleceu o sequenciamento genético dos primeiros dois casos de Covid-19 no Brasil, permitiu com que fosse feito o aprimoramento do mapeamento de disseminação e contaminação do vírus em escala global. Aliás, já se tratavam de variantes diferentes de Wuhan, cidade do centro epidemiológico na China.

Jaqueline/Instagram pessoal

A biomédica chegou a receber o prêmio do Conselho Nacional de Saúde (CNS) no final de 2021, com a Comenda Zilda Arns 2020. Ela também apareceu na revista Forbes em 2022, como um dos 20 nomes femininos de destaque no Brasil. Além disso, a cientista ressalta que irá usar a fama para gerar representatividade em outras meninas e mulheres negras, como também encorajar mais mulheres a ingressar no ramo das pesquisas.

Os relatos dessa semana foram pautados no site da CNS, da FAPESP, do Estadão e do Currículo Lattes da pesquisadora. Aproveite para seguir a Jaqueline no Instagram (@drajaquelinegoes) e fique por dentro dos acontecimentos e reconhecimentos que ela vem tendo no nosso país depois de ser reconhecida mundialmente como uma pesquisadora Brasileira que sequenciou o genoma da Covid-19.

Criação: Gabriela Hessel Jasiocha

Revisão de texto: Luana Talita Gomes

Doença de Chagas: será que estamos a par de tudo? 

Carlos Chagas foi quem desvendou os mistérios do inseto hematófago. Mas será que depois de um século a doença ainda se comporta da mesma forma?

A nossa constatação científica dessa semana, será baseada na revista da Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo (SOCESP), no capítulo intitulado “ASPECTOS EPIDEMIOLÓGICOS E CLÍNICOS DA DOENÇA DE CHAGAS AGUDA NO BRASIL E NA AMÉRICA LATINA”, pág. 222, publicado em 2016, no Brasil.

Monumentos Chinchorros em Arica, no Chile

As primeiras evidências da Doença de Chagas foram dadas há aproximadamente 9 mil anos atrás. Sua constatação foi verificada por meio de análises laboratoriais de DNA feitas em múmias achadas no deserto do Atacama, no Chile. As múmias diziam respeito aos povos Chinchorros, que eram considerados nômades de regiões litorâneas e montanhosas. Além disso, alguns povos acabaram por trazer o protozoário causador, Trypanosoma cruzi, para dentro dos domicílios ao iniciarem a criação de roedores para obtenção de comida, passando a serem os portadores do agente infeccioso. Já no Brasil, temos a datação de uma múmia de 560 e um fragmento de osso com idade entre 4.500-7.000 anos, que constam o DNA do T.cruzi.

Quando os Chinchorros passaram a fixar residência, houve também o processo de desmatamento do local, para que assim houvesse moradia e agricultura de sustento. Essa ação facilitou o processo de disseminação do inseto popularmente conhecido como barbeiro, o triatomíneo (Triatoma infestans). 

O mais interessante – e que comprova a ligação direta com o desmatamento – é que os indígenas da Amazônia não sofreram com a infecção. Segundo o artigo, a situação possui como justificativa o fato das populações possuírem diferentes costumes de manuseio de solo, moradia e criação de animais, e, por esse motivo, poderiam vir a estar com uma imunidade resistente a esse tipo de proliferação. 

Carlos Chagas

Porém, foi em meados de 1909 que Carlos Chagas – o higienista e bacteriologista brasileiro -avança suas descobertas científicas. Naquela época, Chagas trabalhava na campanha anti-malária em Minas Gerais, durante a construção da linha férrea da região. O mesmo notou a presença de um inseto de porte grande e que estaria sugando sangue dos trabalhadores ali presentes. 

Quais são e como foram descobertos os modos de infecção da Doença de Chagas? 

Após investigações biológicas do inseto, o higienista percebeu a presença de um protozoário flagelado, que veio a batizar de “Trypanosoma Cruzi”, em homenagem a Oswaldo Cruz,um dos precursores das ações sanitaristas no Brasil. Apesar de Carlos ter feito experimentos em saguis da época, não foi possível encontrar o desfecho. O mesmo só foi permitido dois anos após os estudos, quando ele teve contato com uma paciente de dois anos, a qual teve em seu exame sanguíneo o aparecimento do mesmo flagelado. Foi assim que ele conseguiu comprovar a trajetória de infecção e quais seriam os sintomas, ganhando a homenagem da patologia: a Doença de Chagas.

Oswaldo Cruz

O modo de infecção daquele período, hoje é considerado o modo clássico. Afinal, ao longo de novos estudos foi possível apresentar novas formas de transmissão. O método clássico consiste na picada do barbeiro, que, ao sugar o sangue, também acaba defecando em nossa pele. Os depósitos deixados acabam gerando uma reação alérgica, que ao coçarmos também acabamos criando fissuras, possibilizando a entrada do protozoário que foi eliminado pelas fezes. Desse modo, ele entra na nossa corrente sanguínea, nos infectando. Além disso, há também outros clássicos como: infecção via transfusão de sangue, transplante de órgãos e via placentária. Mas fiquem tranquilos, esses últimos tipos de contaminação já são considerados erradicados na América Latina. Detalhe: erradicar não significa extinguir, ainda existem casos, mas raros. Porém, a gestão de saúde pública tem feito vistorias minuciosas para que nada passe despercebido.

E o que ocorreu nessa trajetória que fez toda a diferença e nos colocou em estado de alerta?! 

Pois bem, com a semi-industrialização dos alimentos provindos de origem natural, como as frutas. Isso ocorre porque alguns insetos acabam sendo triturados durante o processo de colheita, até porque somente a lavagem nem sempre é tão eficaz na seleção. Alguns alimentos que podem ser contaminados, por exemplo, são o açaí e a cana de açúcar, alimentos muito adorados pelo inseto portador do protozoário T.cruzi, o barbeiro. Entretanto, segundo as últimas pesquisas feitas, apesar do DNA do protozoário ser localizado nas comidas distribuídas, não foi possível detectar se esse fragmento é contagioso. 

Inseto conhecido como barbeiro

A mazela criou proporções epidemiológicas no Brasil, mas, infelizmente, não ouvimos falar no assunto quanto deveríamos. Tal patologia, que era antes considerada uma endemia, ou seja, uma doença concentrada em uma porção regional. Acabou se tornando uma epidemia, enfermidade que acomete em um país ou até mesmo no continente. Nesse caso, estamos vivenciando manifestações de surtos regionais em toda a América Latina. No Brasil, segundos os dados referentes a 2000 até 2013, temos uma taxa de, aproximadamente, 1.500 novos casos por ano, em que mais de 90% são contraídos via oral. Por isso, vale se atentar ao consumo de açaí, caldo de cana, goiaba, tangerina e outros tipos de sucos e frutas semi-industrializadas.

De modo geral, a Doença de Chagas é oito ou oitenta, pois pode apresentar sintomas graves – que levam ao óbito – ou até mesmo pacientes assintomáticos. Além disso, os primeiros sinais podem levar de 10 a 15 anos, se não mais. Devido as duas formas de contágio, há a possibilidade de ter duas ou mais diferentes manifestações primárias em nosso organismo.

Protozoário Trypanosoma cruzi

Quando falamos da contaminação pela picada, é comum notar os linfonodos inchados, irritação e protuberância local. Já pela ingestão, acaba sendo mais discreta por se tratar de forma interna. Sendo assim, a constatação da doença será dada por meio dos sintomas mais comuns, que são: cefaléia, mal-estar, perda de apetite, febre, linfonodos e fígado inchados. A forma de detectar a fase aguda, é quando o protozoário já se encontra no coração, causando inchaço e posteriores distúrbios cardiovasculares como: taquicardia, sopro, dispinéia e arritmia. O paciente chagásico em fase aguda, precisa de constante atenção médica, uma vez que o inchaço de um dos nossos principais órgãos pode levar ao infarto inesperado. O curioso é que a fase aguda pode evoluir também de enfermos assintomáticos, o que redobra a nossa atenção. Os sintomas pioram e se tornam mais letais em imunossuprimidos, em que pode acelerar a evolução da doença e até mesmo, em casos raros, causar a contaminação do cérebro.

O trágico, é que muitos pacientes não procuram ajuda ou não recebem o diagnóstico correto por se tratar de sintomas genéricos. O ideal de reconhecimento da enfermidade, é por meio do exame laboratorial de fezes dentro dos primeiros 30 dias após o aparecimento dos sintomas. Ou ainda, a análise de sangue no momento em que o paciente esteja febril. Caso o suspeito não se enquadre nos termos citados, terá que ser realizado investigações mais sensíveis como Strout, microhematócrito ou creme leucocitário. 

Por isso, em caso de sintomas mencionados, não hesite em procurar a unidade básica de saúde mais próxima. Quanto mais cedo a doença for descoberta, mais a sua vida será prolongada.

Criação: Gabriela Hessel Jasiocha

Revisão de texto: Luana Talita Gomes

César Lattes e o méson duplo

Saiba um pouco sobre a história do brasileiro que deu origem ao nome da Plataforma e do Currículo acadêmico brasileiro mantido pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq)

Os relatos a seguir foram pautados no artigo intitulado de “CÉSAR LATTES: UM DOS DESCOBRIDORES DO ENTÃO MÉSON PI”, de José Maria Filardo Bassalo e publicado em Belém do Pará, Brasil, no ano de 1989.

César Lattes

O curitibano, César Lattes, nasceu em 11 de julho de 1924 e teve a maior parte do seu período estudantil no Brasil. A sua graduação em bacharelado de Física veio no ano de 1943, pela Universidade de São Paulo (USP). Posteriormente, assumiu cargos de assistência em Física Teórica na Faculdade de Filosofia, Ciência e Letras da USP.

Em meados de 1946, após ter tido um contato com o seu ex-professor, Giuseppe Occhialini, César passou a se interessar em fazer parte do grupo inglês de estudos e pesquisa da Universidade de Bristol. O convite realizado para oficializar a sua entrada, partiu especialmente de Cecil Frank Powell, físico responsável pelo desenvolvimento do método fotográfico para estudos de processos nucleares, e também, responsável por descobertas relacionadas com os mésons.

Naquela época, Occhialini e Powell estudavam sobre o espalhamento elástico entre prótons e nêutrons, dando a Lattes a tarefa de calibrar a chapa de emulsão nuclear. A intenção era obter o maior alcance de prótons e partículas alfa convertidas em energia. Essa conversão possibilitaria a determinação do fator de contração da emulsão após a revelação.

Interessado em continuar os estudos da área, Lattes buscou calcular a energia dos nêutrons usando de uma emulsão carregada de boro, que, ao receberem o feixe de nêutrons, gerou duas partículas alfa e três moléculas de hidrogênio. Tal evento tornou possível o cálculo desejado por Lattes, mas, para ele, ainda era considerado pouco. Então, continuou buscando formas de aperfeiçoar a técnica para que tivesse melhor resultado.

Giuseppe Occhialini

Com base nisso, Lattes pediu para que Occhialini levasse chapas de emulsões, com e sem boro, durante as suas férias a serem passadas em Pirineus, na França. Isso porque, nesse mesmo local, havia o observatório cósmico no Pic du Midi. Sendo o ambiente ideal para exposição das chapas de emulsão.

Após o retorno da viagem, Lattes, Powell e Occhialini foram examinar as chapas já reveladas e acabaram por constatar que as placas com boro tinham mais manifestações do que as outras. Isso ocorreu por conta do pH – escala numérica de representação entre ácido e básico – que era ideal para conservação dos aparecimentos. Após receber o auxílio de observação da microscopista, Marietta Kurz, o grupo detectou um evento raro composto por um duplo méson, nome designado para um traço grosso sendo acompanhado de outro traço mais brando.

Estando vorazes por mais respostas, o trio composto por Lattes, Powell e Occhialini  continuavam as suas buscas por mais eventos. Até que Lattes teve a ideia de recorrer a montes mais altos que o Pic du Midi, encontrando assim o Monte Chacaltaya, na Bolívia. Foi então que César, expôs as placas durante um mês e ao voltar para Londres, o grupo conseguiu constatar mais de trinta manifestações de méson-duplo.

Hideki Yuhawa

  Ainda no ano de 1947, o mundo se encontrava no período da Segunda Guerra Mundial, o que acabou dificultando a disseminação de informações e descobertas científicas. Por isso, quando Lattes tomou como base as pesquisas de Marcello Conversi, Ettore Pancini e Oreste Piccioni, foi porque ele ainda não tinha obtido os resultados da equipe de Yukawa. Talvez isso poderia até ter modificado o rumo da trajetória, pois as ideias são um tanto quanto conflitantes. Os três italianos descobriram que os mésotrons interagiam de forma fraca com o núcleo. O que vai de conflito com a teoria de Yukawa, em que eram uma unidade de méson em decadência.

Por fim, César desejava obter mais resultados de méson-duplo e para isso seria necessário utilizar um acelerador de partículas alfa. O mais próximo e existente da época era o sincrocíclotron, localizado em Berkeley na Califórnia. Ele já imaginava que o acelerador não traria resultados o suficiente, e foi por isso que contou com a ajuda de outro físico brasileiro, o José Leite Lopes, para calcular a energia do movimento interno e potencializar seus resultados.

Em 1948, com o auxílio de Eugene Gardner em Berkeley, eles conseguiram localizar o primeiro méson-duplo negativo. Em sequência, Lattes, Gardner e John Burfening, produziram os mésons pi positivos.  Além disso, Lattes também constatou o primeiro pi nulo da história.

Cecil Frank Powell

As descobertas tiveram enorme repercussão dentro e fora do Brasil. É fato que quem descobriu o méson pi foi o físico Hideki Yukawa, mas Lattes fez descobertas ainda mais profundas sobre o assunto e não foi honrado no Prêmio Nobel de 1950 – cujo título foi dado a Powell. Ao contrário do que possamos imaginar entre picuinhas e trapaças. Os injustos da história eram as próprias regras da premiação, dando o mérito somente para quem chefiava as equipes.

Lattes, após a descoberta das variações de méson duplo, ocupou cargos de professor, pesquisador e até fundador de instituições de pesquisa no Brasil. O mesmo teve uma cadeira de cargo no CNPQ – currículo dos brasileiros leva o seu nome até hoje. Além disso, colecionou diversos outros prêmios científicos Brasil afora e também ocupou cargos internacionais importantes, como ser o regente da cadeira Física-Teórica e Física-Matemática na Inglaterra.

Refletindo sobre as buscas de César Lattes, principalmente, quando contadas resumidamente, parece ter sido muito fácil, mas não foi! Ele precisou de muita ajuda de amigos, políticos e colegas de trabalho. Tal fato pode ser evidenciado quando precisou falar com representante do Brasil na Comissão de Energia Atômica das Nações Unidas, o Almirante Álvaro Alberto da Mota e Silva, a fim de conseguir autorização para acessar o sincrocíclotron nos Estados Unidos.

Para o brasileiro, fazer ciência nunca foi, e ainda não é fácil. Sempre exigiu muito esforço, dedicação e a passagem por perrengues, que, muitas das vezes, são frutos da desvalorização governamental e populacional.

Criação: Gabriela Hessel Jasiocha

Revisão de texto: Luana Talita Gomes